É triste perceber que a realidade tem mostrado algo bem diferente. O Carnaval só tem sido mais uma ocasião para apresentar o grande hiato de desigualdade do nosso território. Cordas separam brancas/os e negras/os e a presença dos camarotes apontam que a “cidade alta” continua lá, oprimindo e perpetuando distâncias.Um dos aspectos do direito à cidade é o do livre acesso, locomoção e ocupação dos espaços públicos. O Carnaval em Salvador segue uma lógica bastante controversa para a concretização desse direito humano. Durante a grande festa, as vias públicas são loteadas por grandes empresas, que restringem, em quase sua totalidade, a possibilidade das pessoas que não possuem condições financeiras e/ou vontade para comprar a entrada de um camarote, usufruírem de uma festa que é vendida como popular. Pontos de ônibus são retirados, vias de acesso possuem suas rotas reduzidas e alteradas, marcas de produtos das patrocinadoras impõem o seu uso exclusivo: quanto de cidadania resta depois de tantas restrições?
Mas as limitações de direitos não param por aí. A indústria da festa mascara atrocidades quando o tema é o das relações de trabalho. Pessoas negras e que fazem parte das classes mais baixas são cotidianamente colocadas em uma relação de servidão, ocupando espaços que remuneram muito mal e com péssimas condições de trabalho. Cordeiros são um exemplo disso. Recebem um valor aproximado de 30 reais por dia e a garantia de xingamentos, maus tratos e muita segregação.
Existe somente um Carnaval em Salvador? As divisões bem demarcadas têm mostrado que não. Enquanto existirem cordas e camarotes, mais e mais contrastes perpetuarão a lógica de desigualdade social e racial das grandes cidades.
Luã Lessa
Gestor da sede Bahia
TETO – Brasil
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