Por Fernanda Menuci
Não são recentes as dificuldades da comunidade Abraão com o abastecimento de água. Mas foi em 2017 que os moradores do lugar, com a ajuda do financiamento proporcionado pelo projeto FunTETO, se organizaram para encontrar soluções estáveis para o problema.
O projeto Torneira Social, idealizado pelos moradores da comunidade e criado em conjunto com os voluntários do TETO, foi financiado pelo edital FunTETO. A construção foi a primeira feita através do edital no estado do Paraná. O projeto consistiu na implantação de reservatório para captação de água da chuva, ligada a torneira, em local de acesso comunitário. A construção foi finalizada em setembro deste ano.
A comunidade Abraão está localizada nos fundos do complexo de comunidades do Caximba, em Curitiba. Com cinco anos de existência, é atualmente uma área de expansão, abrigando em torno de mil pessoas, conforme levantamento do TETO. A comunidade, porém, não está ligada à rede de esgoto e não recebe água tratada de forma legal. Por isso, segundo dados da última ECO (escutando comunidades) de 2016, 93% das moradias das comunidades do Caximba usam de tubulações clandestinas para a captação da água que abastece as casas.
Devido às diferenças de elevação no terreno e à longa distância em relação ao ponto inicial de fornecimento, as tubulações improvisadas não atendem a toda a comunidade Abraão. Estão sujeitas também a cortes da empresa fornecedora de água, a rompimentos e a fluxo irregular, que acabam afetando toda a comunidade. Luzia Andrade Cruz (45), líder comunitária que esteve à frente do projeto Torneira Social, explica que os moradores enfrentam regulares períodos de escassez. “Nós lançamos o Torneira Social porque vimos que havia a necessidade para a comunidade. A gente chegava a ficar 15 dias com escassez de água’’, conta ela.
“A gente sempre teve dificuldade com água. Como eu já padecia, não tinha água encanada e como nosso esgoto era em céu aberto, não tinha como você ter uma água pura para consumo”, diz Luzia. A água transportada irregularmente não tem garantia de qualidade devido ao possível contato com o esgoto presente no solo. Dados da última ECO mostraram que nas comunidades do Caximba 53% das moradias tem destinação do esgoto doméstico a céu aberto.
Para garantir o uso seguro, a água da chuva acumulada no reservatório do Torneira Social recebe tratamento por meio de produtos. O reservatório tem capacidade de armazenar três mil litros d’água, usadas para diversos fins e atendendo às demandas das famílias que não tem acesso direto a conexão clandestina.
O plano para o reservatório era anterior ao envolvimento com o FunTETO. Pelas dificuldades que os moradores enfrentam, chegaram à conclusão que seria a melhor opção. “Estava juntando o dinheiro. A gente usa o bazar para fazer isso e ajuda de terceiros. Daí eu conversava com um e com outro e vi que ficaria um custo muito alto”, explica Luzia. Foi assim que, conversando com uma das voluntárias do TETO, soube da existência do edital FunTETO. “O objetivo do projeto é servir à comunidade. Veio o apoio financeiro do FunTETO, a mão de obra do TETO e da comunidade, então unimos o útil ao agradável’’, conta ela.
O valor atingido permitiu uma extensão do Torneira Social, com a construção de uma caixa d’água emergencial de mil litros para armazenar a água vinda das conexões. Hoje, as duas caixas d’água atendem as demandas da população.
Ademir Eliseu Hoffman (56) mora na parte dos fundos da comunidade Abraão, onde a água da tubulação não chega. Para satisfazer as necessidades da família, Ademir precisa buscar água na torneira comunitária duas a três vezes ao dia. Por ser diretamente afetado pela falta de fornecimento, foi um dos moradores voluntários que se propôs a ajudar na realização do Torneira Social, e se beneficia hoje do projeto.
Além da união para concretizar o reservatório, a manutenção é também um exercício comunitário. A limpeza contínua da caixa d’água e da torneira é trabalho dos moradores, assim como a fiscalização para que não haja desperdício.
O TETO e a Caximba
A relação do TETO com as comunidades do Caximba começou em 2014, com a introdução da Equipe de Comunidades e a realização da primeira ECO (Escutando Comunidade), identificando suas condições socioeconômicas, dando um panorama das principais demandas dos moradores. A construção das primeiras casas emergenciais aconteceu em dezembro do mesmo ano, com a entrega de duas delas. Ainda em 2014, alguns voluntários, juntamente com uma moradora do Caximba, criaram a organização “Amigos da Caximba”, que hoje realiza ações como Dia das Crianças, Natal, Páscoa e Dia das Mães com os moradores da comunidade.
Em 2015 ampliou-se a área de atuação da Equipe de Comunidades, e mais 7 casas emergenciais foram entregues em setembro, aumentando a confiança dos moradores em relação ao TETO. Mais nove residências forem entregues em dezembro, feitas com a mão de obra dos moradores e voluntários em conjunto com amigos e familiares.
Em 2016, em parceria com a organização Amigos do Caximba, foi construída a Biblioteca da Caximba, que proporcionou um espaço para as crianças desempenharem atividades de lazer e educação, uma das carências levantadas pelos moradores.
No ano de 2017 houveram mais entregas de casas emergenciais, assim como a realização da sede comunitária nas comunidades 1o de Setembro e Espaço Verde (ambas na Caximba) e a implementação do Torneira Social, que marcou o início do FunTETO no Paraná. Segundo Luzia, há expectativas para a criação de um segundo projeto através do edital, para promover as aulas de capoeira na comunidade Abraão.
O FunTETO
O FunTETO é um edital que possibilita que comunidades candidatem seus projetos e recebam auxílio financeiro e apoio na construção e realização, visando fomentar o desenvolvimento comunitário. A realização parte primeiramente dos moradores, que apresentam o projeto e formalizam a inscrição. Havendo aprovação, o TETO disponibiliza 60% do valor total, ficando a cargo da comunidade arrecadar 10% e negociar com terceiros para providenciar os 30% restantes.