Andreia Rodrigues, ou Deia, como é chamada pelos amigos e vizinhos, é nome conhecido na comunidade Gênesis, em Campinas. Seu jeito ativo, explícito em cada gesto e fala, já denuncia o que é ser Deia: a personificação da ação. Foi ela um dos braços direito do TETO na comunidade durante toda a construção de moradias em julho de 2017.
A líder comunitária de 30 anos integra o grupo majoritário de pessoas que vivem em favelas. Mulher negra, Deia sempre teve consciência de sua negritude, um orgulho passado de mãe para filha: “eu falava ‘mãe, minha amiga tem o cabelo liso’, e ela sempre me falou que a gente era bonita do jeito que era. Ela dizia: ‘olha para sua pele filha, olha como você é linda’”, conta.
Ao lado da irmã, Deia lembra que o amor próprio fez muita diferença na adolescência das duas. “A gente sempre se achou muito bonita por ser negra, e tivemos as mesmas oportunidades com namorados. Eu e minha irmã sempre fizemos sucesso”.
Em sua trajetória, Deia conta que nunca sofreu preconceito escancarado, apenas atitudes veladas, principalmente ao que envolve seu filho Nicolas. Muitas vezes ela presenciou o estranhamento das pessoas quando se apresentava como mãe de um garoto branco. É por isso que, na sua opinião, a mulher negra precisa se firmar desde muito cedo. Seus grandes exemplos estavam na família, como as tias e, claro, sua mãe, que sempre se impôs. Para a líder, “se elas sofreram algum preconceito, passaram por cima dando risada, porque elas se aceitam mesmo”.
Não faltaram exemplos em casa, porém, quando o assunto é representatividade na mídia e publicidade, Deia não poupa críticas: “Em muitas farmácias eu já vi anúncio de anticoncepcional com mulher negra. Eles acham que só a mulher negra tem que tomar anticoncepcional? Agora, a mulher branca está na campanha de lingerie. Então quer dizer que a mulher negra não veste lingerie? É raro eu pegar uma revista de cosméticos e ver uma negra, por exemplo”.
Para a campineira, a televisão também não ajuda. “Sabe o que me incomoda muito? Há cinco participantes de um programa, um é negro. Não poderiam ser dois negros? Um exemplo é o Big Brother, que coloca um casal negro só para falar que teve negro”.
Ainda assim, há mulheres que representam Deia na televisão, porém, ela foge de nomes óbvios como Taís Araújo e Maju, preferindo a jornalista e apresentadora do Jornal Hoje, Zileide Silva. “A Maju é uma mulher negra bonita, como a Tais Araújo e a Glória Maria, mas eu gosto de pessoas que são impactantes, e para mim o jeito que ela apresenta o jornal, que ela se impõe, é muito legal”. Mas nem sempre essa representatividade, mesmo que pequena, existiu. Assim como a maioria das crianças de sua geração, Deia era fã da Xuxa. “Nós pegávamos blusa branca e colocava na cabeça como se fosse cabelo. Daí colocávamos a galocha de chuva e shortinho e ficávamos pulando como as paquitas”, lembra.
Deia está positiva quanto aos jovens de hoje em dia. Para ela, atualmente as meninas negras têm a mente muito aberta e sabem se impor. “Até as meninas negras que são um pouco mais claras hoje assumem mais sua negritude”.
O amor próprio, tão visto nas jovens negras, é celebrado por Deia, que é um exemplo neste assunto. Muito consciente do poder que possui, a jovem líder comunitária emana uma confiança e autoestima que deve ser celebrada. “Eu amo ser negra e não me vejo de outra forma, não vejo a Andreia de outra cor”.
Com as paquitas no passado, serão pessoas como Deia as responsáveis por inspirar as meninas negras, não só na periferia, mas em todo o Brasil.