Na madrugada do dia 30 de Junho, foi aprovada na Câmara dos Deputados a PEC 171 que prevê redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, após a mesma ter sido reprovada no plenário algumas horas antes. Agora, o projeto vai para a votação em segundo turno na própria Câmara dos Deputados antes de seguir para o Senado, onde será analisada pela Comissão Nacional de Justiça (CNJ) e por outra comissão especial antes de prosseguir para o plenário, onde precisará do voto favorável de 49 senadores para ser aprovada*.
Como organização que trabalha em diversas comunidades da periferia de grandes metrópoles brasileiras, falar sobre esse projeto é necessário, já que são nesses espaços que está concentrada uma grande parte da população jovem do país. A população de 0 a 18 anos que reside em favelas é maior do que a média nacional. Enquanto no Brasil esse número é de aproximadamente 30%, em comunidades pobres pode chegar a representar 50% da população, como é o caso do Jardim Gramacho, comunidade na Baixada Fluminense onde o TETO atua desde 2013.
Precisamos perceber e enxergar a realidade de vulnerabilidade extrema na qual essas crianças e jovens estão inseridos desde seus primeiros anos de vida. Em sua grande maioria, negros e pobres, desde cedo, enfrentam a dura realidade do racismo, exclusão social, acesso precário a direitos e serviços como moradia, saneamento básico, saúde e educação. As oportunidades para o desenvolvimento de meninos e meninas menores de 18 anos devem ser adaptadas para suprir a violação de direitos e falta de liberdade de escolha que esses jovens e seus pais tiveram ao longo de sua vida. Hoje, as exigências para inserção no mercado de trabalho, por exemplo, requerem inglês avançado, endereço regular e visão de futuro: “onde você quer estar em cinco anos?”. Exigências distantes e irreais para quem está sempre à margem, correndo risco do despejo e vivendo na iminência de se tornar mais um número nas estatísticas de assassinato de jovens negros nas periferias.
Acreditamos que aqueles que cometem crime aos 16 anos têm o dever jurídico de responder pelas suas ações e receber uma pena (no Brasil, a responsabilidade penal é de 12 anos, sendo o jovem responsabilizado por seus atos caso julgado culpado), mas não podemos abrir mão como sociedade da responsabilidade pela efetivação dos direitos de menores de 18 anos, permitindo que esses passem a responder por infringir a lei penal na condição de adulto. São necessárias medidas socioeducativas de recuperação e reinserção, como já previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
O TETO é contra a redução da maioridade penal e acredita que uma sociedade justa e sem pobreza é construída a partir da escuta e compreensão também da população jovem. Em vez de criminalizá-los por serem negros, pobres e da periferia, encarcerá-los pelas condições e dinâmicas que a própria sociedade lhes impõe, precisamos criar e apresentar às crianças e adolescentes oportunidades reais e acessíveis para seu desenvolvimento e inserção social.
*Em casos de emenda à Constituição, não há interferência da Presidência, logo não poderá ser vetada em caso de aprovação no Senado.